Manaus, AM
Caro leitor, o Brasil debate o novo Código Florestal. Leia abaixo notícias e artigos a respeito.
(do Blog Ecossocialistas)
“Relatório do Código Florestal é presente para ruralistas e ataque à proteção ao meio ambiente”, afirma Ivan Valente
O plenário ficou pequeno para todos os que quiseram acompanhar a leitura do relatório do deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB/SP) na Comissão Especial da Câmara dos Deputados que analisa as propostas de reforma do Código Florestal. Dedicado aos “agricultores brasileiros”, o texto, na avaliação do deputado federal Ivan Valente, atende às principais reivindicações do agronegócio e representa um verdadeiro retrocesso ao reverter mais de cinco décadas de legislação ambiental no país. “É um presente para os ruralistas e um ataque à proteção ao meio ambiente”, disse.
Eis as principais alterações propostas no texto:
1. As propriedades rurais de até quatro módulos fiscais em todo o país (na Amazônia quatro módulos equivalem a 400 hectares) ficam desobrigadas de manter a área de Reserva Legal, ou seja, a porção de terra com cobertura original para conservação. Para as propriedades maiores, vale o previsto hoje: na Mata Atlântica e Caatinga, o porcentual de Reserva Legal é de 20%; no cerrado, 35%; na Floresta Amazônica, 80%. Mas quando for “impossível” para os proprietários cumprirem a regra, será possível fazer compensações em áreas de preservação coletiva, a serem definidas pelo Estado.
2. Além de dar autonomia para os Estados definirem os porcentuais de área de Reserva Legal, a flexibilização da aplicação das leis ambientais também está dentro dos “direitos” estaduais, ignorando a necessidade de uma legislação ambiental federal. Os Estados podem, por exemplo, autorizar a queima de campos e florestas ou a derrubada em encostas entre 25 e 45 graus. Caberá a eles definir também quais áreas desmatadas devem ser recuperadas, inclusive com espécies exóticas.
3. Áreas de Proteção Permanente (APPs), como margens de nascentes, córregos, rios, lagos, represas, topo de morros, dunas, encostas, manguezais, restingas e veredas também poderão ser devastadas. A faixa mínima de mata ciliar, por exemplo, em vez de 30m passa a ser de 15m, podendo chegar a 7,5 m, uma vez que os Estados poderão diminuir até 50% disso.
4. A propriedade rural não terá que cumprir mais sua função social. O texto do relatório revoga um artigo do código, de 1934, mantido na revisão de 1965, que trata as florestas como bens públicos. Se o contribuinte não estiver disposto a pagar pela conservação ambiental, o fazendeiro pode fazer o que entender nas terras que ocupa.
5. Há a possibilidade de anistia completa aos desmatadores que cometeram infrações ambientais antes de 22 de julho de 2008. A pressão dos ruralistas já havia garantido a suspensão de multas pela falta de registro das áreas de Reserva Legal e pelo desmatamento das Áreas de Preservação Permanente até junho de 2011. Agora, pelo relatório, as condições de recomposição serão definidas em planos estaduais em até cinco anos. Ou seja, eventuais punições ficariam suspensas até o fim do próximo mandato presidencial.
Esse conjunto de mudanças legalizaria a situação de 90% dos produtores rurais brasileiros, que hoje não cumprem a legislação ambiental. “Ou seja, o relatório premia aqueles que historicamente desrespeitaram o meio ambiente, além de insinuar que desenvolvimento só se faz com destruição da natureza”, critica Ivan Valente.
Para Sergio Leitão, diretor de Campanhas do Greenpeace, o relatório abre uma brecha para acabar em definitivo com a reserva legal. “Qualquer fazendeiro com mais de 600 hectares de terra na Amazônia poderá fracionar sua propriedade para fugir da obrigação”, acredita. Durante a leitura do relatório, ambientalistas presentes ao plenário manifestaram-se levantando cartões vermelhos para as propostas apresentadas pelo deputado relator.
O deputado Ivan Valente prepara um voto em separado na Comissão Especial e, nesta quarta-feira (09/06), data prevista para a votação do relatório, pedirá vistas ao documento.
Consultoria do agronegócio
O líder do PSOL na Câmara também questionou a imparcialidade do relatório de Aldo Rebelo, lembrando que parte significativa das audiências públicas aprovadas na Comissão Especial sequer foram realizadas e denunciando a contratação da advogada Samanta Piñeda, consultora da Frente Parlamentar da Agropecuária, ligada à Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), que recebeu R$ 10 mil por contribuições na formulação do parecer de Rebelo. O dinheiro foi pago com a verba indenizatória do deputado do PCdoB e do presidente da comissão especial, Moacir Micheletto (PMDB-PR).
“Está claro que este relatório tem lado”, criticou Ivan Valente, que vai apresentar requerimento para que Samanta Piñeda preste esclarecimentos acerca de sua participação na elaboração do relatório.
* Com informações das agências Câmara e Estado.
09/06/2010
Novo Código Florestal é uma bofetada no país
por Leonardo Sakamoto – 08.06.2010
O deputado federal Aldo Rebelo (PC do B-SP) apresentou hoje seu relatório na comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa as propostas de reforma do Código Florestal.
Entre as mudanças, sugere que as propriedades rurais de até quatro módulos fiscais em todo o país fiquem desobrigadas de manter área de reserva legal (aquele tanto de terra que é mantida com sua cobertura original para conservação). Organizações da sociedade civil que se manifestaram contra as mudanças do projeto, como o Greenpeace, dizem que grandes proprietários vão poder fracionar a terra apenas no papel, vendo-se, na prática, livres de respeitar reserva. Mesmo que a lei proíba essa manobra, a confusão fundiária que reina no interior do país a garantiria. Na Amazônia, quatro módulos equivalem a 400 hectares.
De acordo com o projeto, a área de reserva legal na Amazônia será de 80% para propriedades em áreas de floresta, 35% em áreas de savana e 20% em formações campestres. No restante do país, o valor será único: 20%. Com isso, o Cerrado perderia 15%, dando lugar a lavouras de cana, a soja, o algodão e, é claro, a produção de carvão vegetal.
As Áreas de Proteção Permanente (APPs), como margens de nascentes, córregos, rios, lagos, represas, topo de morros, dunas, encostas, manguezais, restingas e veredas, também levaram pancada. Um exemplo é a faixa mínima de mata ciliar, que passa a ser de 15 metros, podendo chegar a 7,5 m, uma vez que os Estados poderiam diminuir até 50% disso. Vale lembrar que garantir a qualidade da vegetação ao longo de rios e córregos é a diferença entre um futuro com ou sem água.
O projeto também conta com uma anistia a quem cometeu infrações ambientais antes de 22 de julho de 2008. Ou seja, regularizando-se sob as novas regras (mais leves que as atuais), estaria perdoado. É a política de fato consumado: é proibido, mas faço mesmo assim porque no futuro a lei vai mudar ou eu serei perdoado.
As propostas ainda têm um longo caminho para serem aprovadas pelo Congresso Nacional, além de terem de passar pela sanção presidencial antes de virar lei. Como o pacote muda muita coisa, dificilmente passará dessa forma e deve sofrer alterações. De forma otimista, acho que foi como um bode na sala. E cheira tão mal quanto.
Um tarimbado ambientalista disse que Aldo provocou, com seu relatório, a ira de muitos membros tradicionais da bancada ruralista na Câmara dos Deputados. Pois, agora que ele fez todo o serviço, seus colegas ficaram sem ter o que defender diante de seus eleitores.
Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Cobriu conflitos armados e o desrespeito aos direitos humanos em Timor Leste, Angola e no Paquistão. Já foi professor de jornalismo na USP e, hoje, ministra aulas na pós-graduação da PUC-SP. Trabalhou em diversos veículos de comunicação, cobrindo os problemas sociais brasileiros. É coordenador da ONG Repórter Brasil e seu representante na Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo.
(Publicado originalmente em http://www.blogdosakamoto.uol.com.br/)
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